30 de abr. de 2011

"Diário da Manhã" entrevista presidente da ACDHRio sobre quantitativo de uniões civis homossexuais divulgado pelo censo do IBGE

Um dos maiores jornais diários do Estado de Goiás, com sede em Goiânia, o "Diário da Manhã" (DM), entrevistou por telefone, na tarde desta sexta-feira, 29/04, o presidente da ACDHRio e secretário de Comunicação da Aliança LGBT do Estado de Goiás (ALGBT-GO), jornalista Terry Marcos Dourado, sobre os resultados do Censo Nacional divulgados no mesmo dia pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE).
Veja, a seguir, a íntegra da reportagem publicada na edição deste sábado, 30/04, do DM:



Editorias - Cidades
Censo sem preconceito
Pela primeira vez, IBGE divulga dados sobre casais do mesmo sexo. Em todo o País, eles são 60 mil e em Goiás, 1.593

29 de Abril de 2011 | Por: Cristiane Lima
Da editoria de Cidades, com agências
Pela primeira vez o Censo brasileiro incluiu dados sobre união estável de casais do mesmo sexo na pesquisa. Em todo o País, 60 mil parceiros declararam morar sob o mesmo teto. Em Goiás, o número registrado foi de 1.593, que corresponde a 0,02% do total de 6 milhões de habitantes no Estado. E o número de mulheres continua maior que de homens. A relação entre os gêneros, segundo o estudo, é de 96 homens para cada 100 mulheres. O levantamento destacou ainda que, em dez anos, a população da capital goiana aumentou 20%, passando de 1 para 1,3 milhão, 12ª maior população entre as cidades brasileiras. Os números foram divulgados ontem pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Para a servidora pública federal Elisabete Maria dos Santos, 51, e a bibliotecária Ana Luisa de Souza Vilela, 36, a pesquisa retrata que cada vez mais os direitos e as garantias dos homoafetivos estão sendo reconhecidos pela legislação e pela sociedade. O casal, no entanto, considera que o estudo demorou para ser realizado, já que o perfil da família brasileira está em mutação. “Há anos gostaria de declarar que tenho uma companheira, mas não existia espaço para isso durante a entrevista do Censo”, afirma Elisabete.
Ela conta que foi entrevistada no ano passado por uma recenseadora do IBGE. Na época, a pesquisadora declarou que o casal foi o primeiro a confirmar a convivência homoafetiva. “Isso é muito bom. É preciso intensificar os estudos nessa área.  Também é necessário que as pessoas do mesmo sexo que vivem juntas saiam da sombra e tenham coragem para assumir essa relação.”  Ana Luisa considera a pesquisa fantástica e, ao mesmo tempo, uma vitória para a categoria.
“Hoje, temos condições de mostrar que existimos, contribuímos e temos um papel na sociedade”, diz. Segundo a bibliotecária, apesar das conquistas, ainda falta maior divulgação sobre o registro da união de pessoas do mesmo sexo que é feita nos cartórios. “Além desses direitos que já estão sendo reconhecidos, acredito que outras garantias vão surgir independente de religião, cor e sexo.”
Ana Luisa cita como uma das suas conquistas a oportunidade de ter sido colocada  como dependente no plano de saúde da companheira. Elisabete e Ana Luisa moram juntas há 11 anos. O casal foi o primeiro a conquistar na Justiça goiana o direito de adotar uma criança do sexo feminino. A decisão histórica foi deferida em junho de 2009 pelo juiz do Juizado da Infância e Juventude de Goiânia, Maurício Porfírio.
Para o secretário de Comunicação da Aliança de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais do Estado de Goiás (ALGBT-GO), Terry Marcos Dourado, considerando que muitas uniões homoafetivas estão ainda no anonimato, o resultado da pesquisa é uma conquista para o movimento em âmbito nacional. “Esse estudo é um incentivo para as pessoas assumirem sua identidade sexual. Isso contribui para combater e diminuir o preconceito”, afirma.
Dourado acredita que o número de casais gays que moram juntos seja o dobro do divulgado pelo IBGE, somente em Goiás. “Estima-se que vivem juntos hoje mais de três mil no Estado. “À medida que as pessoas enfrentam isso com naturalidade, os números vão expandir.” Ele ressalta que essa divulgação ajuda a quebrar o estigma social de que a união gay é promíscua. “Pelo contrário, a pesquisa mostra que as relações são sólidas entre pessoas do mesmo sexo.”
Segundo consta na pesquisa, a região Sudeste obteve o maior número de registros de pessoas do mesmo sexo vivendo juntas em união estável. A maior parte está no Estado de São Paulo, que registrou 16.872 casais. Logo em seguida aparece o Rio de Janeiro, com 10.170. Minas Gerais possui 4.098 casais que declararam viver juntos sob união estável e o Espírito Santo registrou 1.062 casais.


“Eu acho que esse número é bem maior”

Rejane Lima
Da Agência Estado, de santos
Moradores do Guarujá, na Baixada santista, o administrador financeiro Ronaldo Costa, de 34 anos, e o funcionário público Luiz Eduardo dos Santos, de 39, estão entre o crescente número de casais homossexuais que residem como cônjuges, conforme aponta o IBGE no Censo 2010. “Eu acho ainda que o número é bem maior do que estão divulgando, porque nós não fomos contados no censo, e nem outros dois casais de amigos nossos de São Paulo”, disse Costa, que conheceu seu parceiro há nove anos, há oito mudou-se de Barretos, no interior de São Paulo, para viver com ele no Guarujá e em 8 de julho de 2006 assinou a “declaração de união homoafetiva”, documento que comprova a existência de uma relação entre duas pessoas do mesmo sexo e garante alguns direitos ao casal, como o reconhecimento de planos de saúde e na declaração como dependente no Imposto de Renda.
“Foi no dia do meu aniversário que assinamos (a declaração)”, afirma Costa, contador por formação que, além de ser consultor financeiro e dono de um bufê, coordena o Centro de Convivência Joana D'Arc, uma organização não governamental (ONG) direcionada a apoiar pessoas infectadas pelo vírus HIV e a trabalhar na prevenção da Aids e outras doenças sexualmente transmissíveis (DSTs). Entre outras ações, a ONG ajuda casais a fazer a declaração de união homoafetiva.
“A ONG auxilia, formaliza os contratos, os casais e as testemunhas assinam e é registrado no cartório de notas. Desde 2005, já foram 30 declarações de casais homossexuais de homens e mulheres da Baixada santista e até de outros estados, como Rio Grande do Sul, Minas, Rio e Mato Grosso do Sul”, afirma Costa, revelando que apenas um desses contratos foi dissolvido depois.
Embora afirme que tanto a sua família quanto a do seu companheiro sempre foram compreensivas, Costa diz que o preconceito em relação ao homossexual ainda está muito presente e não diminuiu ao longo desses oito anos que mora junto com Santos. “Mas o que eu sinto aqui é que a sociedade está se conscientizando e deixando de ser preconceituosa porque essa é uma região turística e a maior parte do público LGBT tem um bom poder aquisitivo e é altamente consumidor.”
Subnotificação
“É natural que ocorra subnotificação quando questões são tratadas pela primeira vez”, afirmou o presidente do IBGE, Eduardo Nunes. Em 2007, o instituto incluíra a pergunta em uma contagem parcial realizada em municípios com até 170 mil habitantes. No Censo 2010, a maior concentração absoluta de casais formados por pessoas do mesmo sexo foi verificada na região Sudeste (32.202).
Nunes citou o aumento do número de pessoas que se declararam negras nos últimos levantamentos para explicar o que poderá ocorrer em relação aos casais do mesmo sexo nas próximas pesquisas. “A declaração da proporção de população negra aumentou bastante, não porque aumentou a fecundidade nesse grupo, mas porque o sentimento de pertencimento cresceu, e a consciência é maior. Quanto maior é a consciência, maior é a resposta afirmativa”, afirmou o presidente do IBGE. “É certo que nos próximos censos esse número tenderá a aumentar, o que não significará dizer que haverá mais casais do mesmo sexo se unindo.”  O número de 60.002 casais representa 0,16% do total de cônjuges do País.